domingo, 3 de maio de 2009

in memorian: Augusto Boal, um ícone nacional do Teatro

Infelizmente, faleceu, estes dias, por causa de leucêmia, um dos maiores dramaturgos e ensaístas do país, Augusto Boal(vide foto abaixo), o gênero teatral conhecido como "Teatro dos Oprimidos".



Logo abaixo esta um parece do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado do Ceará (SATED-CE) sobre o falecimento deste grande exemplo de luta pela Arte e Cultura.


Caros Colegas da Arte,

Temos a tristeza de compartilhar a perda irreparável de um dos mestres do teatro nacional e mundial.

Faleceu há poucas horas o grande teatrólogo brasileiro Augusto Boal.

“Um mestre insubstituível, um dos deuses do arquipélago do teatro, um dos mitos da nossa religião.” (Aderbal Freire Filho)

No último dia 25 de março, o teatrólogo Augusto Boal foi nomeado Embaixador Mundial do Teatro pela UNESCO. A cerimônia aconteceu na Maison Fontenoy, em Paris, com participação dos membros do International Theatre Institute - ITI, do qual o Brasil é integrante.

Segue mensagem da UNESCO, escrita por Boal:

AS PALAVRAS DE AUGUSTO BOAL

(International Theatre Institute / Institut International du Théâtre ITI
iti@iti-worldwide.org / www.iti-worldwide.org)

Augusto Boal adere à Marcha Mundial pela Paz e a Não-violência.
Dia Mundial de Teatro - 27 Março, 2009

“Todas as sociedades humanas são espetaculares no seu cotidiano, e produzem espetáculos em momentos especiais. São espetaculares como forma de organização social, e produzem espetáculos como este que vocês vieram ver.

Mesmo quando inconscientes, as relações humanas são estruturadas em forma teatral: o uso do espaço, a linguagem do corpo, a escolha das palavras e a modulação das vozes, o confronto de idéias e paixões, tudo que fazemos no palco fazemos sempre em nossas vidas: nós somos teatro!

Não só casamentos e funerais são espetáculos, mas também os rituais cotidianos que, por sua familiaridade, não nos chegam à consciência. Não só pompas, mas também o café da manhã e os bons-dias, tímidos namoros e grandes conflitos passionais, uma sessão do Senado ou uma reunião diplomática – tudo é teatro.

Uma das principais funções da nossa arte é tornar conscientes esses espetáculos da vida diária onde os atores são os próprios espectadores, o palco é a platéia e a platéia, palco. Somos todos artistas: fazendo teatro, aprendemos a ver aquilo que nos salta aos olhos, mas que somos incapazes de ver tão habituados estamos apenas a olhar. O que nos é familiar torna-se invisível: fazer teatro, ao contrário, ilumina o palco da nossa vida cotidiana.

Em Setembro do ano passado fomos surpreendidos por uma revelação teatral: nós, que pensávamos viver em um mundo seguro apesar das guerras, genocídios, hecatombes e torturas que aconteciam, sim, mas longe de nós em países distantes e selvagens, nós vivíamos seguros com nosso dinheiro guardado em um banco respeitável ou nas mãos de um honesto corretor da Bolsa - nós fomos informados de que esse dinheiro não existia, era virtual, feia ficção de alguns economistas que não eram ficção, nem eram seguros, nem respeitáveis. Tudo não passava de mau teatro com triste enredo, onde poucos ganhavam muito e muitos perdiam tudo. Políticos dos países ricos fecharam-se em reuniões secretas e de lá saíram com soluções mágicas. Nós, vítimas de suas decisões, continuamos espectadores sentados na última fila das galerias.

Vinte anos atrás, eu dirigi Fedra de Racine, no Rio de Janeiro. O cenário era pobre; no chão, peles de vaca; em volta, bambus. Antes de começar o espetáculo, eu dizia aos meus atores: - “Agora acabou a ficção que fazemos no dia-a-dia. Quando cruzarem esses bambus, lá no palco, nenhum de vocês tem o direito de mentir. Teatro é a Verdade Escondida”.

Vendo o mundo além das aparências, vemos opressores e oprimidos em todas as sociedades, etnias, gêneros, classes e castas, vemos o mundo injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo porque sabemos que outro mundo é possível. Mas cabe a nós construí-lo com nossas mãos entrando em cena, no palco e na vida.

Assistam ao espetáculo que vai começar; depois, em suas casas com seus amigos, façam suas peças vocês mesmos e vejam o que jamais puderam ver: aquilo que salta aos olhos. Teatro não pode ser apenas um evento - é forma de vida!
Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!”


(Augusto Boal)

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